O que é metáfora em libras?
A metáfora em Libras (Língua Brasileira de Sinais) é um recurso linguístico que, assim como nas línguas orais, utiliza-se de sinais para representar conceitos de maneira figurada, criando uma imagem mental que ajuda a transmitir significados abstratos ou complexos de forma mais concreta e visual.
Na Libras, a metáfora pode ser criada de várias maneiras, como:
Iconicidade: O uso de sinais que se assemelham visualmente ao que representam. Por exemplo, o sinal para "coração" pode ser usado metaforicamente para representar "amor" ou "sentimento".
Espacialidade: Utilização do espaço à frente do corpo para representar relações ou conceitos abstratos. Por exemplo, a ideia de "altura" pode ser representada com a mão se movendo para cima ou para baixo.
Movimento e Direção: Alterações no movimento ou direção de um sinal podem adicionar significados metafóricos. Por exemplo, um movimento rápido pode simbolizar "pressa" ou "urgência".
Expressão Facial e Corporal: As expressões faciais e corporais são essenciais em
Libras e podem adicionar camadas de significado metafórico aos sinais. Por
exemplo, uma expressão facial de surpresa pode ser combinada com um sinal para
intensificar o impacto da mensagem.
Esses recursos são usados
para criar metáforas que ajudam a comunicar ideias complexas e abstratas de uma
maneira que é intuitiva para os usuários de Libras, tornando a comunicação mais
rica e expressiva.
Significado em contexto - o caso das metáforas na língua brasileira de sinais
No Brasil, a metáfora na
língua de sinais brasileira foi tema de dissertação defendida por Faria (2003),
onde teceu delineamentos teóricos acerca desse tipo de figura de linguagem,
buscando alicerces nos estudos de metáforas na ASL (língua de sinais americana).
Lembrando que a metáfora
tem seu fundamento, sua construção, sua inteligência e entendimento alicerçado
na cultura de cada falante ou sinalizante de um país, nota-se que os surdos
acham estranhas as palavras ditas em português em que há certa peculiaridade
nos significados atribuídos pelos ouvintes na sua interação social. Isso
acontece com o significado real da expressão dada pelos ouvintes, em que se constrói
com base nas relações e ressignificações de cada grupo social, cultural. A seguir
apresentamos o trecho de Faria (2003) que refere este fenômeno:
Os vocábulos das línguas, ao serem concatenados,
produzem uma infinidade de trocadilhos cujos significados flutuam dos mais
transparentes aos mais opacos; dos mais simples aos mais inusitados; dos mais
grotescos aos mais poéticos. Essa recursividade encontra-se carregada da
cultura vivenciada pelos indivíduos, na comunidade a que pertence. Por isso, muitas
vezes, o que se diz é somente entendido por falantes nativos de dada língua ou
por quem se encontra imerso nessa comunidade, por anos trocando, tropeçando e
descortinando construções e interpretações as mais variadas, originadas no arcabouço
linguístico e criativo das trocas comunicativas. Exemplo disso está o fato de
que questões culturais incorporadas à LP não têm sido transmitidas naturalmente
aos surdos brasileiros, como acontece com os ouvintes que, quando crianças,
ouvem expressões ‘estranhas’, mas, aos poucos, vão descobrindo o que realmente
elas significam e as naturalizam.
No entanto, o foco desta
seção está nas metáforas na própria língua de sinais que podem ser de difícil
compreensão para aqueles que estão aprendendo esta língua, exatamente pelo
mesmo motivo exposto acima. Os ouvintes que estão aprendendo a língua de sinais
têm dificuldades em compreender as relações e ressignificações que não partem
dos significados dos próprios sinais, mas que apresentam uma interpretação
culturalmente estabelecida.
É comum a Língua de Sinais
Brasileira recorrer a empréstimos linguísticos para complementar algo ou,
ainda, os surdos naturalmente captam a ideia, as significações próprias da
Língua Portuguesa e convencionam o sinal semelhante na forma e no sentido, como
por exemplo, o fraseologismo “segurar a vela”. Tal exemplo significa que a pessoa não quer ficar
“sozinha” com casais ou casal. E os surdos quando souberam da
gíria proveniente do universo ouvinte, passaram a adotar a referida gíria na
língua de sinais utilizando o sinal de “vela”. Assim
estabelece, conforme a autora, uma metáfora equivalente na forma (“segurar
a vela”) e no sentido (“não
ficar sozinho...”) para ambas as línguas. Da
mesma forma, há metáfora semelhante em que é equivalente no sentido, mas
diferente na forma.
Por outro lado, há sinais
em que não há equivalência na Língua Portuguesa e são originários do universo
linguístico criados pelos próprios surdos.
Foi observado como exemplo
de caso uma faculdade de Manausi, em que o intérprete sinalizava todas as
gírias proferidas por alunos e professores ouvintes e, a partir de então, os
surdos começaram a aperfeiçoá-los na forma e no sentido, ocorrendo o fenômeno
da metáfora equivalente. Logicamente, que se tratava de empréstimos
linguísticos, contudo o fenômeno foi observado. Aos poucos, os surdos tendo uma
espécie de “base linguística” para o desenvolvimento de metáfora obtida com recursos
utilizados pelos ouvintes, elaboravam outras ainda mais peculiares da cultura
surda, resultando em sinais de metáfora diferente. Exemplos: [VASSOURA] = demissão;
[INTELIGENTE] com movimento para baixo = burro.
Percebe-se, nesse tempo,
que a autora elaborou uma taxionomia fazendo uma comparação entre a língua de
sinais brasileira com a língua portuguesa e obteve dados das escolas de surdos
do Distrito Federal. Classifica-se a metáfora da língua de sinais na comparação
com os seus itens e fraseologismos em contraste com os da Língua Portuguesa.
METÁFORA
EQUIVALENTE (equivalente na forma e no sentido): nesse caso, quando contrastam as duas línguas,
verifica-se uma igualdade na forma escrita e na sinalizada, como é o caso de “cabeça
dura”, cuja escrita é esta e
que na sinalizada também remete à sinalização envolvendo a cabeça + o sinal de
duro. Com relação ao significado, os dois parâmetros (forma e
sentido) se coincidem nas duas
línguas: ser teimoso. Outros exemplos:
[CARA-DE-PAU]
[FOLGADO]
[FICAR-DE-QUEIXO-CAÍDO]
[SEGURAR-VELA]
METÁFORA
SEMELHANTE (equivalente no sentido, mas diferente na forma): ambas as línguas possuem formas equivalentes, como
por exemplo, existe a mímica de uma mão tocando no cotovelo, entretanto o seu
significado varia: para a Libras, tal sinal significa ciúme, para a Língua
Portuguesa, é uma mímica representativa de dor de cotovelo. Outros exemplos:
FINGIR-NÃO-VER;
ENTRAR-NUM-OLHO-E-SAIR-NO-OUTRO
ESTAR-APERTADO-PARA-IR-AO-BANHEIRO;
ESTAR-COM-DOR-DE-BARRIGA
MORRER-DE-RIR;
CHORAR-DE-RIR
METÁFORA
DIFERENTE (diferente no sentido e na forma): comumente
oriundo do universo linguístico dos surdos, não tendo correspondência na Língua
Portuguesa. Na Língua Portuguesa encontra-se apenas tradução dos sinais
[OLHOS-CAROS] = PESSOA QUE TEM AMPLA ACUIDADE
VISUAL, PODE
INDICAR TAMBÉM ESPERTEZA.
[MÃOS-DURAS] = QUE NÃO TEM MUITA FLUÊNCIA EM LS
[MÃOS-LEVES] = QUE SABE SINALIZAR MUITO BEM
O campo de metáforas em língua de sinais brasileira é imenso e necessita ser desbravado do norte ao sul, por todo o Brasil, nós, como professoras, apenas apresentamos estes pequenos exemplos, e o momento é de vocês, alunos, os primeiros graduandos em Letras/Libras!
Referência
FARIA, Sandra Patrícia. (2006) Metáfora na LSB: debaixo dos panos ou a um palmo de nosso nariz?
ETD - Educação Temática Digital - Vol. 7, N° 2.
FARIA, Sandra Patrícia de. A metáfora na LSB e a construção dos sentidos no desenvolvimento
da competência comunicativa de alunos surdos. Dissertação de Mestrado. Brasília,
Universidade de Brasília, Instituto de Letras, 2003.